A 12 de Março dei início, aqui nesta “máquina”, a uma série de posts/ textos que pretendem expor alguns “pedaços da nossa História”, com recurso a autores ou passagens de livros, que nos descrevem o evoluir de vários aspectos destas 9 Ilhas, desde que foram descobertas, em meados do século XV.
Quem provavelmente melhor e mais detalhadamente registou os primórdios da história e povoamento, não só dos Açores, mas também dos restantes arquipélagos da Macaronésia (Madeira, Canárias e Cabo Verde), foi o cronista Gaspar Frutuoso, através dos seis livros (alguns com mais do que um volume) que compõem a obra, “Saudades da Terra”.
Nascido em 1522 na Ilha de S. Miguel, Gaspar Frutuoso partiu rumo a Espanha onde se formou em Artes e fez doutoramento em Teologia na Universidade de Salamanca. Regressado à terra natal, é nomeado Vigário da Matriz da Ribeira Grande em 1565, tendo desempenhado este cargo até 1591, data da sua morte.
Deixo aqui dois pequenos trechos do volume I, do Livro IV de “Saudades da Terra”, livro este composto por três volumes, e que se debruça sobre a ilha que viu nascer o cronista, S. Miguel.
“Chegando aqui à ilha os novos descobridores, tomaram terra no lugar onde agora se chama a Povoação Velha, pela que ali fizeram depois, como adiante contarei: e desembarcando entre duas frescas ribeiras de claras, doces e frias águas, entre rochas e terras altas, todas cobertas de alto e espesso arvoredo de cedros, louros, gingas e faias, e outras diversas árvores, deram todos, com muito contentamento e festas, graças a Deus, não as que por tão graça mercê se lhe deviam.”
“Depois de achada a ilha de S. Miguel, tornando para o Reino os seus descobridores, foram pelo mar, enquanto a não perdiam de vista, para trás atentando e notando sua figura, e viram que em cada ponta de sua compridão tinha um mui alto pico, que assim como eram os dois extremos dela, assim eram também extremados na grandura e em grande quantidade e altura sobrepujavam a todos os mais montes que pelo meio havia; e demarcando-a por eles o piloto, para a depois poder melhor reconhecer, sendo chegados a Sagres e havendo o Infante feito mercê da Capitania dela a Frei Gonçalo Velho juntamente com a ilha de Santa Maria, tornou logo a mandar, ou o mesmo Frei Gonçalo Velho e o piloto, ou o piloto só sem ele, com outra companhia, a deitar gado e aves e outras coisas necessárias, e provar a ventura de sua fertilidade também com sementes de trigo e legumes; com que partiram de Sagres e navegando com próspera viagem, vindo à vista da Ilha, vendo-a o piloto, a desconheceu por lhe ver um só pico do oriente e não ver o outro da banda poente com que à ida a demarcara; porque neste meio tempo, enquanto eles foram ao Reino e tornaram, aconteceu que se alevantou o fogo a primeira vez sabida nesta terra, e ardeu aquele alto pico para a banda do noroeste desta ilha, junto da ponta dos Mosteiros, onde agora se chamam as Sete Cidades às cavidades dela, das quais depois particularmente contarei. E dizem que o mesmo piloto e os dos navios viram no mar muita pedra pomes e troncos de árvores que dali saíram, sem entender a causa disto. Mas, ainda que então e depois foram achados os sinais e efeitos deste fogo que fez arrebentar aquele pico, não foi visto, por não ser povoada a ilha no tempo que se arrebentou.”
Até parece que São Miguel quis “arrebentar” com o pico, para assim abrir aquela magistral caldeira das Sete Cidades, de modo a poder brindar, com tamanha beleza, aqueles que primeiro iam povoar a Sua Ilha. Enfeitiçá-los, para que se dispusessem a aguentar as amarguras da sobrevivência naquele pedaço de terra instável e distante.
1 comentário:
Muito bom.
Penso que começa a ser unânime entre os açoreanos que se devia leccionar História dos Açores desde o antigo 1º ano do preparatório até ao 9º e depois ser opção.
Eu, pelo menos, tenho muita pena de não ter aprendido a nossa História quando estava na escola, em vez de dar a Revolução Industrial, ou a Francesa, repetidamente. Mas para mim, tem um aspecto positivo, fez com que aprendesse e lesse a nossa Histõria, inclusivamente (partes)das Saudades da Terra, com outra idade...
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