Os níveis altíssimos de abstenção que se têm verificado nos últimos actos eleitorais - e que temo se repitam nestes dois próximos ., são, só por si, demonstrativos do crescente distanciamento do cidadão comum em relação à política. Este é um sintoma grave, não só porque se coloca nas mãos de uma minoria de eleitores o futuro do país e das suas Regiões Autónomas, mas sobretudo pelo facto de, desta forma, se promover um esvaziamento de exigência na actividade dos partidos e, consequentemente, um alheamento dos mais jovens em relação à política, à qual esta faixa etária se refere com um desprezo e desinteresse total e crescente.
Este facto coloca menos pressão sobre aqueles que se embrenham na politíca, e contribui para que os mesmos se eternizem nas estruturas partidárias, daí derivando uma evidente falta de caras novas na actividade dos partidos, e, naturalmente, nas listas a apresentar a eleições. Não fosse a duvidosa valia da lei da paridade a obrigar os partidos a colocar nas suas listas um terço de mulheres, esse vazio de gente nova, e a desejada e imprescindível renovação, seria ainda mais evidente.
Digo isto, porque a minha convicção é a de que são essencialmente os mais jovens aqueles que olham para a política e para os seus intervenientes, como se de um mundo à parte de tratasse, como se esta actividade não representasse, afinal, a garantia de um regime estável e democrático. Olham para quem se dedica à política sem compreender - ou sem querer acreditar -, que são aqueles os actores, encenadores e realizadores, de todas as medidas que regulam o nosso quotidiano, e que as suas acções podem melhorar ou condicionar o nosso futuro individual e colectivo.
Claro que também há um outro grupo de desacreditados: os que olharam para o fim da Ditadura como a porta de passagem para uma sociedade em que os melhores, com abnegação e sentido de serviço público, guiariam os demais de encontro a uma sociedade justa e próspera.
O Governo de José Sócrates teve, no seu início, algumas medidas corajosas, e a limitação de 3 mandatos no exercício de cargos políticos foi, sem dúvida, uma delas, pois eu advogo que a renovação trás inovação. Ademais, a perpetuação de uma pessoa em determinada função, só pode levar a uma estagnação e, mais grave, a uma teia de interesses e influências que vai contra os interesses do Estado, logo, da sociedade que este serve e protege.
Só existem várias forças partidárias em regimes abertos e democráticos. Estas são estruturas organizadas que devem procurar servir a sociedade onde desenvolvem a sua actividade. Neste sentido é lógico e desejável, que nestas estruturas (partidárias) tenham lugar os mais capazes e bem preparados, para desenvolver e promover as políticas que almejam colocar em prática na busca do bem comum. Por isso, os partidos devem estar abertos e atentos à sociedade onde se inserem. Mas, por vezes, aquilo que se constata, é que estes se fecham sobre si próprios, dando origem a uma espécie de “clube de amigos“, que se protegem e cuidam uns dos outros, em lugar de olharem para o exterior, analisando e diagnosticando os problemas e potencialidades da comunidade que dizem pretender ajudar a melhorar.
Quando me refiro a “clube de amigos“, digo-o pois os protagonistas dos vários actos eleitorais são quase sempre os mesmos. Basta olhar para as listas de candidatos dos próximos dois actos eleitorais, e perceber que, em vez de se aproveitar para dar espaço e oportunidade a gente nova, as listas de candidatos preferem recorrer à “prata da casa” e colocar ao sufrágio dos cidadãos, actores por demais conhecidos, gente que desempenha ou já desempenhou cargos políticos. Parecem galos com pelouro fixo, embora por vezes mudem de capoeira.
A nível parlamentar, quer seja na Assembleia da República, quer na nossa Assembleia Legislativa Regional, constatamos que os protagonistas lá permanecem durante várias legislaturas, que as novas caras vêm do interior do chamado aparelho partidário (quantas vezes gente sem qualquer formação ou experiência, logo, que não trazem nada de novo……aliás, tristemente alimentam os vícios, em vez de apresentarem virtudes) e que as intervenções em plenário são sistematicamente produzidas pelos mesmos deputados. Não vou tão longe como alguns, afirmando que aqueles que não intervêm nada fazem, mas o que sei é que os deputados estão distribuídos por várias comissões parlamentares, e deviam ser estes a tomar a palavra quando os temas a discussão são do âmbito das suas comissões. Mas como se perdem, muitas vezes, em tricas partidárias, e não na discussão séria e produtiva dos vários diplomas a votos, os oradores de serviço são os que mais retórica possuem e não os que mais sabem da matéria.
Este cenário acaba, inevitavelmente, por afastar muita gente capaz e com competência provada, da actividade politico-partidária.
Termino admitindo, embora com pesar, que Medina Carreira tem cada vez mais razão no desfiar do seu descrédito.
6 comentários:
Nova revolução não é a solução, mas sim participação activa, de quem acha que pode acrescentar algo positivo, via partidos. Mesmo com outra revolução teremos que ter partidos, pois são estrturas necessárias ao bom funcionamento da Democracia.
Constato, com algum pesar, que não há efectivamente renovação, mas apenas porque as condições permitem a tal eternização no poder, essas condições são fornecidas pelos próprios membros dos partidos, mas também pela sociedade que é letárgica. No entanto, também constato que há caras novas, infelizmente talvez devido à lei da paridade, com a nossa "vizinha" Lídia Bulcão, da Ilha Dentro de Mim e outros.
Descrições apuradas e (relativamente) verdadeiras, como é o caso desta e outras, levantam-me sempre a questão: E a solução? Não quero crer que seja uma revolução...
Rui,
quando coloco como etiqueta "Nova Revolução, é a solução", não me refiro, claro está, a uma mudança de Regime. Pois, como refiro, os partidos são parte integrante do Regime Democrático, são, aliás, essenciais à sua manutenção. É essa pluralidade que nos dá liberdade de escolha e novas vias.
Concordo quando referes que a solução passa por uma participação activa dos cidadãos. Mas o que eu - e muitos - constatam, é que o facto dos partidos se fecharem sobre si próprios, mantendo as mesmas estruturas e pessoas nos cargos e listas eleitorais, faz com que não abram as suas fileiras a gente nova e, consequentemente, a novas ideias e energias.
A actividade politico-partidária não é, nos dias que correm, muito apelativa. A Revolução passaria por, os líderes partidários, terem a coragem de conquistar os cidadãos, e não os seus colegas "camaradas" ou "companheiros". Fazem-no por temerem perder os apoios dentro das estruturas partidárias e, assim, ficarem fora das listas a qualquer coisa. A tal perda do "tacho".
Insurjo-me contra os jogos de poder que se fomentam dentro dos partidos. São esses que afastam as pessoas dos partidos, e que contribuem para que os mesmos protagonistas se eternizem naquilo que devem ser FUNÇÔES politícas, e não a PROFISSÂO de alguns.
A verdadeira evolução teve lugar em Abril de 1974. Aquela que necessitamos agora, é uma REvolução de mentalidade por parte de quem integra os partidos. Só se pode dignificar a actividade politica com gente competente e que não faça da politíca a sua actividade profissional, mas antes um serviço público em prol da sociedade e não em prol de si e dos seus.
Muitos eleitores já viraram(infelizmente) as costas à politica. Pura e simplesmente não votam nem se interessam. Outros há que, cansados do "vira o disco e toca o mesmo", começam agora a dar o benefício da dúvida a partidos mais pequenos, tais como o BE. Basta olhar para a constituição actual da nossa ALR para perceber que aqueles que ainda votam, não são parvos.
Este debate dá pano para mangas, mas não possso deixar de acrescentar três notas às vossas.
1º A meu ver, a falta de interesse dos cidadãos e a indisponibilidade para trabalhar pelo bem comum são talvez os sintomas mais graves do estado da nossa política. Muitos pensam que estão a castigar os políticos com a abstenção, mas estão antes deixar-lhes carta branca para decidirem a seu bel prazer. Acredito que se todos nos empenhássemos numa cidadania mais activa, a política teria mais valor. Mas na política, como na vida, não basta exigir tudo a todos - é preciso também dar uma parte de nós. O primeiro grande passo a dar passa talvez pelo combate ao crescente egoísmo da nossa sociedade. O mais problema é que é muito mais fácil olhar para o umbigo do que para os outros...
2º A limitação de mandatos é como a lei da paridade - não deviam existir numa democracia saudável, mas infelizmente são necessárias...
3º Acho que a renovação é necessária nos partidos, mas a experiência e a sabedoria da idade não podem ser menosprezadas. Nem nos partidos, nem na vida. Na nossa sociedade há uma tendência para menosprezar os mais velhos, como se fossem trapos, mas a idade e a experiência são óptimos conselheiros. O problema maior são os vícios (os do sistema e os outros), que muitas vezes se instalam por falta de gente nova que os combata com energia. Quando aos 27 anos assumi a co-direcção do jornal Tribuna das Ilhas, tinha um director com 75 anos e foi uma das experiências profissionais mais enriquecedoras que tive. Se novos e velhos trabalhassem juntos mais vezes, talvez tudo fosse bastante diferente. Na política e na vida.
Saudações faialenses,
LB
Cara Lídia Bulcão,
antes de mais, agradeço a sua intervenção nesta questão que a todos nos diz respeito e deve interessar.
Em relação aos dois primeiros pontos do seu comentário, creio que o meu ponto de vista está explícito no post e no comentário anterior. Em suma, concordo, no essencial com o que escreve, embora no que toca ao ponto 1 eu culpe mais os "actores", do que os "espectadores", pelas razões apresentadas.
Quanto ao seu 3º ponto, percebo o que quer dizer.
Mas reforço a ideia de que a "experiência" deve advir de uma vida profissional, para depois ser transposta para a politíca.
Estou certo de que não defenderá que a "esperiência e sabedoria" devam ser conquistadas através da permanência num cargo público ou político durante muito tempo....(ainda que no seu 2º ponto se manifeste contra a limitação de mandatos).
É que eu não concebo bons politícos sem uma vida profissional própria e sem uma sabedoria conquistada ao abrigo de uma actividade de "terreno". A teoria nem sempre vai de encontro à prática. Quem desconhece as amarguras de uma vida profissional, e as especificidades de determinada àrea, dificílmente pode apresentar medidas que melhorem ou vão de encontro à resolução dos problemas sentidos por quem esteve por dentro. Este é um ponto essencial para que os eleitores sintam respeito por quem vai a votos, e se sintam impelidos a votar.
Os mais jovens podem, e devem, beber da experiência e sabedoria dos mais velhos. Mas estes últimos podem transmiti-la sem permanecer nas estruturas e cargos politico-partidários. Caso contrário, agarram-se ao poder, por temerem ser apagados e/ou esquecidos, e por se habituarem a ser sempre os timomeiros.
Aqueles que têm a generosidade de contribuir para o bem comum, devem também ter o desprendimento necessário para saber dar o lugar a outros, ainda que permaneçam na retaguarda apoiando e instruindo os mais novos.
cumprimentos
Caro Pedro,
Também concordo plenamente com a necessidade de levar alguma experiência da vida profissional para a política. Os saberes podem e devem ser transversais, para melhores resultados. Até porque só quem já "viveu" alguma coisa é que pode decidir em consciência sobre a vida real dos outros...
Também concordo que é necessário saber sair dos cargos, mas acho que a idade avançada não pode ser o critério. O que interessa é se o contributo ainda é válido ou se, como sugere, poderá prestar um melhor serviço nos bastidores. Cada caso é um caso e as generalizações tendem a ser perigosas.
E atenção: eu não escrevi que era contra a limitação de mandatos, mas apenas que era um mal necessário. Numa democracia perfeita, julgo que não haveria essa necessidade. Mas não existe tal coisa, pois não?
Saudações,
LB
Cara Lídia Bulcão,
tem razão na sua chamada de atenção.
Se reparar, a única modificação que fiz no meu comentário quando o transpus para a caixa de comentários do seu Blog, foi acrescentar "de certo modo" à minha observação ao seu ponto 2.
Fi-lo, exactamente por ter relido o seu comentário e observado que não era categoricamente contra a limitação de mandatos.
Respondendo à pergunta com que termina este seu último comentário, estou, uma vez mais, de acordo consigo: Não. De facto, não creio que o melhor dos regimes conhecidos conceba a perfeição.
Cumprs.
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