... o miúdo, no alto dos seus 8 anos, achou estranho o professor ter faltado à escola, sem avisar. Normalmente, quando tal sucedia, e se previsível, o professor, amigo da família, telefonava no dia anterior, a informar. Naquele dia, pois, achou estranho: teria adoecido subitamente?! Na escola, a velha contínua, encarregada do apoio à sua sala, andava numa lufa-lufa inabitual, com a mesma cara de pau do costume. Dali, não conseguiria nada. A meio da manhã, perante a falta (já constatada) dos outros três professores, dirigiu-se para a "escola paga", para onde diariamente se deslocava, a fim de fazer os deveres. Foi ali que o seu pai o foi recolher, com ar grave, abrindo-lhe, já dentro do carro, as primeiras luzes sobre o que estava a acontecer naquele dia. Pensativamente quedo, algo assustado, foi, em silêncio, até casa. Quando saiu da viatura, encostou-se à parede, apoiou o pé esquerdo contra a mesma, e com a ingénua descontracção própria da idade, desafiou a prudência paterna: Foram os comunistas? Eu vou para lá comandar as tropas contra eles!
Mal sabia ele, o que a sua família iria ainda sofrer às mãos travessas da incerteza revolucionária, devidamente manejada por aqueles que as suas palavras anteviam como o inimigo.
Hoje, aquele miúdo lembra-se muitas vezes das palavras premonitórias de Alexandre O'Neill: A revolução libertou-nos de uma mediocridade, o que não quer dizer que não estejamos a cair noutra.
Hoje, aquele miúdo agradece o dia 25 mas nunca esquece que, se democracia existe, ela se deve a um outro dia 25, sorrateiramente vetado e votado ao esquecimento geral, mas que ele jamais esquecerá, enquanto viver, porque o silêncio não apaga a História.
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