Barack Obama foi reeleito Presidente dos Estados Unidos e
como tinha prometido vai cortar na despesa com a Defesa. Consequentemente, a presença militar dos americanos nos Açores vai ser reduzida em muito. Dos
actuais 800 militares americanos que estão estacionados nas Lajes, passar-se-á
para 160. Já os 300 trabalhadores açorianos que trabalham directamente para a
Base das Lajes certamente serão reduzidos a zero. Como é evidente e como já foi
amplamente falado, isto terá um efeito devastador para a economia da Praia da
Vitória, em primeiro lugar, para a economia da ilha Terceira, em segundo lugar
e finalmente para a própria economia dos Açores.
Várias questões se levantam perante este cenário. Desde logo,
temos que compreender e aceitar que a Base das Lajes, tal como tantas outras
que os americanos têm espalhadas pelo mundo, faz parte de uma doutrina
imperialista de domínio do mundo por parte dos Estados Unidos. Bases como a das
Lajes servem, ou melhor, serviram, para projectar o imenso poder militar
americano sempre que foi necessário e assim proteger um modo de vida do qual
nós, europeus, também beneficiamos. É assim há muito tempo. E há muito tempo
que quase toda a gente, da direita à esquerda, mas principalmente à esquerda,
criticam fortemente esta atitude imperialista norte-americana. Criticam mas
aproveitam os seus benefícios. Nos últimos 75 anos, os Estados Unidos estiveram
presentes, pela calada, em quase todos golpes de estado ou guerras civis que
aconteceram pelo mundo, de modo a terem governos que estivessem nas suas mãos e
terem acesso às principais matérias primas, nomeadamente o petróleo. Foi assim
que os Estados Unidos se impuseram no mundo e se tornaram a maior potência
económica e militar do mundo, trazendo a Europa a reboque. Como Robert Kagan disse, os americanos são de Marte e os europeus são de Vénus (a rever a minha análise ao excelente ensaio de Kagan, O Paraíso e o Poder)
Aliás, há bem pouco tempo, os Estados Unidos
invadiram o Iraque, sem justificação legal, usando a Base das Lajes como ponto
de partida. Mais, na sequência da chamada guerra contra o terrorismo, a Base
das Lajes serviu de ponto de passagem para o transporte de presos políticos que
acabaram por ser vítimas de tortura, alguns deles, sabe-se hoje, alguns eram inocentes. Ou seja, quem defende os direitos dos trabalhadores da
Base das Lajes ou quem critica esta redução do número de militares naquela
Base, tem que ser também a favor da doutrina imperialista americana. Porque a existência
da Base das Lajes serviu para o imperialismo militar americano. Portanto, era
importante esclarecer esta incoerência em que caem quase todos comentadores e
políticos em Portugal e nos Açores.
Por outro lado, há muito tempo que se prespectivava um
cenário de redução drástica dos americanos nas Lajes. Com o avanço da
tecnologia, é possível hoje em dia comandar-se um esquadrão de aviões de
combate a partir de um computador em qualquer gabinete nos Estados Unidos. Além
do mais, desde a queda do Muro de Berlim e do subsequente fim da Guerra Fria
que o centro geográfico das relações internacionais se tinha deslocado do
Atlântico para o Pacífico. Aliás, não é por acaso que os americanos deixaram
simplesmente de pagar por estarem na Lajes a partir de 1996. A este propósito,
já agora, gostávamos de saber quanto é que os Açores valeram a Portugal durante
estes quase 70 anos em que os americanos ocuparam as Lajes e quanto desse
dinheiro chegou aos Açores. Uma questão que nunca foi esclarecida.
Agora, olhando para o futuro, o que se vê é que os Estados
Unidos já não são de todo a potência hegemónica que foram até aqui. Em termos
militares até ainda podem ser, mas em termos económicos já não são. Hoje em dia
é a China que domina o mundo. Estão a fazer uma invasão silenciosa económica
com enorme sucesso em todo o mundo. Agora resta saber quando é que a China
investirá na área militar e assim subsituirem-se aos Estados Unidos como a
potência económica e militar do mundo. E neste contexto, não podemos deixar de
estranhar a passagem do primeiro ministro chinês precisamente pela ilhaTerceira em meados de Junho passado. Nada é por acaso.
É que, apesar de tudo, nós partilhamos de uma herança identitária
com os americanos, pelo que a sua estadia nos Açores sempre foi pacífica. Já
com os chineses, não temos nada em comum. Se os Estados Unidos acabarem por
assumir o fim da doutrina imperialista que tiveram até hoje, ficaremos a perder
de duas maneiras: desde logo, e como se vê, com a perda da dinâmica económica
que davam à região com a sua presença nas Lajes e a médio/longo prazo
perderemos também o nível de vida que estávamos acostumados. A riqueza passará
do Ocidente para o Oriente. Aliás, já está a passar. Esta crise é apenas o
começo do declínio do Ocidente a favor do Oriente.
1 comentário:
Caro Rui Rebelo
No essencial concordo com o seu comentário, mas não posso deixar de reparar que não é forçoso que quem está ao lado dos direitos dos trabalhadores das Lajes esteja de acordo com os ditames dos militares Americanos, talvez fosse muito honroso os trabalhadores Portugueses terem sido objectores de consciência e não terem aceitado servir na base, mas seria exigível que pessoas "normais" pudessem ou quisessem ter estes elevados princípios anti bélicos?
Por outro lado, formalmente as funções dos Portugueses na Base são essencialmente civis, e noutro contexto não ofereciam as reservas que justamente oferecem.
Em termos sindicais existem direitos e obrigações a respeitar, até reforçados pelo facto disto poder constituir uma jogada para diminuir custos e não para deixar de ter um "porta Aviões fixo no Atlântico" sobretudo se houver qualquer hipótese dos Chineses ou outros quaisquer, mostrarem interesse em os substituir.
Quanto ao ter ou não nada em comum, neste mundo globalizado funcionam mais os interesses do que as afinidades, se exemplos faltassem os negócios de Passos,Gaspar, Portas e Borges, estão aí para afirmar esta realidade.
Bom post para entender a realidade da situação geo-estratégica dos Açores e as dinâmicas de desenvolvimento económico, politico e diplomático para os Açores do Século 21.
Parabéns e saudações
Açor
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