Há muito tempo que vêem surgindo à tona notícias sobre a
incapacidade dos Hospitais dos Açores em pagarem as suas obrigações perante os
fornecedores de material hospitalar. Aliás, há mais de um ano, o Presidente do
Tribunal de Contas, Guilherme de Oliveira Martins manifestou profunda
preocupação pela situação de “falência técnica” em que se encontravam os
hospitais no final do ano contabilístico de 2010. Mas até agora, e de uma forma
ou de outra, o serviço regional de saúde ainda não tinha falhado de forma geral
perante os utentes. Ou porque os fornecedores, mesmo sem serem pagos, iam
acautelando os serviços mínimos, ou porque o governo ia injectando aqui e ali
dinheiro para fazer face às necessidades básicas, a verdade é que se conseguiu
ir remediando a situação. Só que na semana que passou aquilo por que já todos
esperávamos aconteceu: o sistema regional de saúde cedeu no bloco operatório do Hospital de Ponta Delgada que pura e simplesmente fechou as portas por falta de material para as cirurgias.
A situação arrastou-se gravemente durante a semana que
passou, com dezenas de cirurgias que estavam marcadas a serem adiadas por falta
de material cirúrgico. Perante isto, o recém empossado Secretário Regional da
Saúde, inacreditavelmente, afirmou desconhecer a situação e exigiu explicações
à Direcção do Hospital. Por sua vez, a Presidente do Conselho de Administração
do Hospital de Ponta Delgada remeteu a responsabilidade para o governo
regional. Ou seja, por um lado vemos um Secretário regional que se diz
surpreendido pela situação, quando toda a gente nos Açores já sabia que era uma
situação que ia acontecer mais tarde ou mais cedo. Por outro lado temos a
Direcção do Hospital a culpar o governo por que não lhe dá os meios para
cumprir as necessidades básicas. No fim de todo este jogo do empurra, estão os
utentes que viram as suas cirurgias adiadas.
Agora, como se tudo isto não bastasse, como se esta situação
já não fosse gravíssima por si só, a Direcção do Hospital conseguiu fazer ainda
pior. Então foi assim: na sexta-feira passada o Hospital emitiu uma nota para a
imprensa a afirmar que tudo estava resolvido e que as cirurgias tinham sido
retomadas. A notícia foi propagada pela comunicação social e tudo parecia estar
a voltar a alguma normalidade. Mas logo no dia seguinte, no telejornal da
RTP-Açores, vemos outra notícia a desmentir o Hospital. Ao que parece os
próprios utentes que deveriam ter sido operados ligaram para a RTP-Açores a
dizer que o Hospital estava a mentir e que não tinham sido operados. Num caso,
imagine-se, a operação foi adiada por falta de luvas higiénicas. E, no fim de
tudo, qual cereja no topo do bolo, vem se a saber que a Direcção do Hospital
contratou uma nova assessora de imprensa, paga principescamente, para fazer o
trabalho que outros dois assessores de imprensa já fazem no Hospital. Ao que parece,
e ironicamente, a luminosa ideia de enviar a tal nota de imprensa a dizer que
afinal já estava tudo bem, foi obra da nova assessora de imprensa.
E agora, nós, os açorianos, os utentes do serviço regional de
saúde, perguntamos: então se o Hospital de Ponta Delgada não tem dinheiro para
comprar uma coisa tão singela, mas imprescindível, como são luvas para
cirurgia, como é que tem dinheiro para contratar mais uma assessora de imprensa
a receber, segundo se sabe, mais de 4000 mil euros por mês, ela sim
prescindível, uma vez que já lá estão dois a fazerem o mesmo trabalho. Como é
que isto é possível? Não há nenhuma resposta que nos sirva, como é óbvio.
Mas a contratação desta assessora deve servir de exemplo. O
Hospital de Ponta Delgada e todo o serviço regional de saúde, já agora, tem que
gerir muito bem os parcos recursos que tem ao dispor. Não podemos continuar
nesta lógica em que o amiguismo se sobrepõe ao superior interesse da população.
Para finalizar, dizer apenas que esta situação está longe de estar
resolvida. Os fornecedores de material hospital nos Açores, há muito tempo que
se queixam de falta de pagamento. O Secretário da Saúde não assobie para o
lado, ele sabia muito bem onde se estava a meter, quando aceitou o cargo. Nós
sabíamos que o governo de César usou e gastou todos os recursos para manter no
poder o seu partido. Soubemos, depois das eleições de Outubro passado que foram
gastos milhões para tudo e todos. Soubemos que tudo foi prometido. E
desconfiamos que isto tudo ia-se transformar numa enorme factura que teríamos
que pagar com juros num futuro muito próximo. Mas acreditávamos que a nova
geração de governantes tivesse uma solução para os problemas estruturais que
foram deixados pela anterior geração gastadora de César. Aparentemente,
estávamos enganados. As cenas dos próximos capítulos continuam já a seguir num
Hospital perto de si.
2 comentários:
Reitero e remeto para o que aqui publiquei nos dias 29/06 e 02/02 de 2012. Foi premonitoriamente sintomático.
perdão, 02/07 de 2012.
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