14 abril 2013

Vítor Gaspar - Um Passado que Pesa


Eu tenho alguma experiência de negociações a nível comunitário. Muitas vezes sentei-me em mesas de negociação entre os Estados-membros e a Comissão Europeia, onde eu trabalhava. Debatiam-se e negociavam-se os mais variados assuntos e cada documento acordado entre as partes era alvo de horas de negociação até à mais pequena vírgula. No fundo, o que se passava era cada representante dos Estados-membros a tentar retirar o melhor para o seu país e a Comissão a tentar encontrar uma posição que servisse a todos e aos superiores interesses da União.

Isto passava-se na Comissão, ou melhor do outro lado da Rue de la Loix, no Justus Lipsius, mas estou certo que em todas as outras instituições europeias, passa-se o mesmo. 

E isto vem a propósito de Vítor Gaspar. Parece que Gaspar não está nas reuniões europeias a tentar retirar o máximo possível para o seu país. Parece que que está alinhado com os interesses das instituições e não com o interesse da população portuguesa. Gaspar, como sabemos, foi Director-Geral da área de investigação do Banco Central Europeu e foi membro do Gabinete de Consultores Políticos da Comissão. Portanto, ele sabe que o papel dos representantes dos Estados-membros, seja a que nível for, é serem chatos e reclamarem sempre mais e melhor para os seus países. Ele não quererá fazer esses papel? Porque, de facto, entre os tecnocratas que trabalham nas instituições, como já foi o seu caso no passado, o melhor cenário seria os Estados-membros aceitarem as regras que eles acham serem as melhores, porque acham que conseguem ver um plano mais amplo e não apenas a visão circunscrita às fronteiras de cada país, como é o caso dos representantes dos Estados-membros, que é o que ele é neste momento. Na verdade, é uma complicação gerir todos estes interesses, ainda para mais numa União com cada vez mais países. E por isso é que são necessárias soluções, não podemos continuar mais no meio desta ponte. O avança-seu para o Federalismo ou então tem que se recuar. Mas enquanto o cenário for este que temos, o papel de Gaspar, por mais que ele não goste, é de lutar pelos interesses de Portugal, apenas e só, em cada proposta, em cada ponto, em cada frase.

E outra circunstância muito relevante que pude constatar no tempo que passei em Bruxelas é que os tecnocratas que trabalham nas instituições, regra geral, consideram os representantes dos Estados-membros um empecilho à sua tal visão mais abrangente, mas no fim de contas todos são naturais de algum país membro e alguns, de certas nacionalidades, colocam o interesse do seu país à frente do tal interesse superior da União. Isto acontece abertamente nos corredores de Bruxelas. Há inclusivamente países que têm uma rede oficiosa de todos os trabalhadores que estão nas instituições, que coordenam para retirarem o melhor para o respectivo país. Portugal nunca fez isso. Nem os Açores, já agora. E podiam.

Portanto, Vítor Gaspar tem que despir o fato de tecnocrata das instituições europeias e vestir de vez o fato de representante de Portugal. Se perder a consideração de alguns ex-colegas pelo caminho, pois que seja, porque, de facto, isso significaria uma mudança de posição relativamente a quase todos os assuntos fundamentais e até uma mudança ideológica. Gaspar ou está com o seu Estado-membro, ou está do lado das instituições. Enquanto não houver avanços a nível dos Tratados, não há meios-termos.

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