13 março 2009

Vilas ou cidades?

Previamente faço uma declaração de interesses: 1- sou um continental apaixonadamente açoriano por amor de uma açoriana. 2- sou livre. Nada mais.

Posto isto, perguntaram-me, num comentário a um "post", se Cascais ou Sintra eram vilas ou cidades e, sobretudo, por que eram corajosas e diferentes.

Sendo um tema que queria abordar mais tarde, não posso ignorá-lo agora, ainda que o faça em traços mais gerais. Fá-lo-ei, apenas, como resposta directa às perguntas efectuadas, deixando para momento mais oportuno, caso se revele necessário, quaisquer outras considerações de carácter político, jurídico ou sociológico.

Assim sendo, percebe-se que estou a falar das duas vilas mais conhecidas de Portugal, vilas essas que, por serem o que são, uma com um peso de cariz mais económico, a outra com uma larga tradição histórico-política, não querem ser ou aparentar ser outra coisa que não aquilo que são. E são, sobretudo, aquilo que os respectivos habitantes transmitem aos estranhos. E o que transmitem eles? A forma natural de pertencerem a cada uma daquelas vilas, tal e qual como elas são, sem qualquer complexo ou sem o desejo bacoco de pretenderem ser aquilo que não são nem deveriam ser. Cascais e Sintra afirmam-se vilas e os seus anónimos habitantes ou os seus governantes não querem ser outra coisa que não vilas. Esta é a diferença. A coragem advém-lhes precisamente do facto de quererem permanecer como vilas, contra qualquer corrente carneirista, vinda da década de 80 do século XX, que grasse onde quer que seja, no sentido exacto de garantirem o seu padrão identitário. E a lógica de tudo isto é simples: o que é que Cascais e Sintra ganham com o facto de passarem a cidades? Tornam-se melhores aglomerados populacionais? Tornam-se melhores e maiores pólos de atracção turistica, comercial ou industrial? Há alguma vantagem concreta para cada uma delas pelo simples facto de deixarem de ser vilas? Não me parece.

Com tudo isto, comparo tal realidade com os Açores e; mais concretamente, com Vila Franca do Campo e Lagoa. Fará algum sentido que a histórica Vila, primeira capital dos Açores, passe a ser cidade? Mais, mutatis mutandis, o que é que Vila Franca do Campo tem a menos do que Sintra ou Cascais ou, já agora, a mais, para querer ser mais do que elas, eclipsando-se no meio de muitas anónimas e anacrónicas cidades? Quererá a Vila seguir o exemplo da Porcalhota (actual Amadora), exactamente naquilo que ela tem de pior? O desenvolvimento económico, social e político de Vila Franca do Campo dependem exclusiva ou principalmente do facto de passar a ser cidade em vez de vila? Vila Franca deveria ter orgulho na sua diferença: é uma vila com um peso histórico indelével que ninguém, nem nenhuma rivalidade, por muito que queira, jamais lhe poderá tirar e que é conhecido de todos. Por isso, qual a razão para ser cidade?

Quanto à Lagoa (que me perdoem os lagoenses), a ideia é ainda mais ridicula. Não existem absolutamente razões nenhumas para ser cidade e a única explicação para tal pretensão radica na mera retaliação política, o que, por ser uma ideia tão inqualificável, me leva a abster de tecer quaisquer outros comentários.

No meio de tudo isto, não se sabe, nem se quer saber e muito menos esclarecer, o que querem as populações, ficando tudo no âmbito do paroquialismo politico, naquilo que etiquetei como "o meu umbigo é maior do que o teu" e "não, eu como mais bifes".

Estarei a dizer alguma coisa inovadora ou intelectualmente profunda? Claro que não.

Expresso simplesmente aquilo que muitos pensam ou dizem muito baixinho e poucos se atrevem a questionar. Porque não o fazem? Não sei nem quero saber. Da minha parte, fiz a minha declaração de interesses.

Obviamente que a minha opinião nada tem de animosidade pessoal contra qualquer político das vilas em causa, concordando ou não com as respectivas opções de governação. Eles exercem os cargos por escolha popular e têm o dever de tomar decisões e efectuar escolhas, com as consequências naturais que as mesmas acarretam. Valerá a pena dizer mais?

10 comentários:

Rui Rebelo Gamboa disse...

1) É bom ver que, por exemplo, as etiquetas começam a fazer sentido.

2) Num tom mais sério, sinceramente este é um assunto sobre o qual não tenho opinião definitiva, necessitando de mais informação. No entanto, posso dizer que, à partida, encarei com enorme desconfiança as duas situações de que falas, e também em concordância contigo, com diferente classificação, isto é, um caso parece-me claramente mais artificial, a Lagoa.

Assim, como estou ainda em fase de captura de info, mas como à partida já encarava com desconfiança e porque este teu texto apresenta fortes argumentos para que não se decrete uma mudança em ambos os casos, estou a um sopro de cair definitivamente neste lado. Falta ouvir uma argumentação convicente do outro que, de certeza, não foi o artigo que hoje [penso que foi hoje, sexta-feira, 13 que saiu] foi publicado no Açoriano Oriental da autoria de um educador que, sinceramente, não me recordo do nome. [não há qualquer maldade recordar o autor do dito artigo como educador e não pelo nome, é apenas porque foi aquilo que me ficou na memória].

Jordão disse...

Como sou fraco em palavras, limito-me a copiar a deputada da terceira fila (a tal dos Contemporâneos): "Apoiado!"

Anónimo disse...

Pelo menos Vila Franca do Campo tem algo que se pode dizer grande: o tempo que demora a pagar as dívidas: em média 833 dias!?!?!?!?!?!? Em 4º lugar a nivel nacional...

Kilas disse...

Antes uma grande Vila do que uma insignificante Cidade. ... sem ofensa para os Ribeiragrandenses!

Pedro Lopes disse...

Caro José,

a única dúvida que tenho para me pronunciar de modo objectivo sobre esta questão, é saber se, de facto, não há vantagens na elevação a cidade de uma qualquer Vila.

Não sei se terão mais apoios e capacidade decisória e, logo, mais oportunidades.?

De qualquer modo, os dois exemplos que deixas (Sintra e Cascais), são claramente situações em que a pré designação do seu nome de origem, nada interfere com o seu potencial, e consequente exploração em beneficio dos que lá vivem.

No caso em apreço (Lagoa e Vila Franca do Campo), e não havendo custos acrescidos para os contribuintes, defendo que sejam as populações locais a escolher se querem ou não solicitar a elevação das suas Vilas a Cidade.

Mas, caro José, com a tua ajuda, fornecida por alguns argumentos (e interrogações) que deixas neste post, pode ser que algum amante da sua Vila, se sinta fortemente impelido a defender que a mesma, permaneça tal como está.....sem que esta posição seja vista como atentatória ao progresso da sua terra.

Anónimo disse...

Caro Pedro
Como referi deixo para mais tarde qualquer análise jurídica, politica ou sociologica, caso haja debate publico e sério, facto de que tenho algumas dúvidas, bastando ver os jornais açorianos, onde apenas li um artigo a defender a elevação de VFC a cidade, embora sem quaisquer argumentos sustentáveis. Foi mais um dicuso tipo "a Madeira tem 6 cidades e nós também temos de ter" ou a velha comparação com a Ribeira Grande, que obviamente também não deveria ser cidade.
No que respeita aos blogadores, comentadores ou jornalistas, é tudo um jogo de interesses. Trão coragem para se pronunciarem pela sua própria cabeça? Por isso fiz a minha declaração de interesses. Gostaria que outros fizessem o mesmo. Até o "Gaspar" que veio ao blog desafiar-me, fingindo ignorância.

Anónimo disse...

Caro José,
Não podia estar mais de acordo consigo.
Mas como vivemos num país de aparências, de vaidades bacocas e invejas mesquinhas, nada me espantaria que tivessemos mais duas vilas elevadas a cidade. Acho que já há muito tempo que nos esquecemos o que deve ser e ter uma cidade... por isso continuo a achar que Escalhão também deveria ser elevada a cidade!
Saudações

Anónimo disse...

Escalhão a cidade e já agora PONTA GARÇA A CONCELHO

Anónimo disse...

Caro José Gonçalves, fico grato pelas minhas questões não caírem em «saco roto». Melhor assim, porque deste modo ganhamos todos uma boa discussão.

- Ostentar o título de cidade pode trazer alguns benefícios para os moradores das antigas Vilas?
- E as desvantagens de deixar de ser vila?
- Quais as condições para se poder ser cidade?

A meu ver o que temos é que começar por responder a estas questões. Só a partir daqui se pode saber se as populações das Vilas candidatas a Cidades querem dar o passo em frente. O que não quer dizer que seja um salto em frente.

Eu não conheço a legislação autárquica o que torna mais difícil construir uma opinião sólida sobre esta matéria.

até breve

Anónimo disse...

Caro Gaspar
Lá irei a esse tema. Mais tarde. Por agora divirta-se com a parte II.
Espero que nos visite e comente regularmente.