O ponto de partida deste post, é o designado “caso Alexandra”. Já todos o conhecemos, pois a Comunicação Social pegou neste drama pessoal e tornou-o numa desgraça pública. O denominado 4º Poder, tem tido o mau hábito de retirar da cartola das fatalidades sociais, alguns “casos” que nos chocam e nos despertam para os dramas alheios, martirizando-nos durante dias com os relatos chocantes e com as mais pequenas trivialidades de cada um destes “casos”.
Se por um lado a Comunicação Social nos deve despertar para algumas realidades esquizofrénicas e escondidas, por outro, não deve – em minha opinião – explorá-los durante dias a fio, como se fossem elas as únicas e as mais dantescas. Estes “casos” acabam por ter todo o enfoque mediático e o privilégio da denúncia pública. São acompanhados pelos mais diversos especialistas na matéria, que os dissecam ao mais ínfimo pormenor por detrás do grande ecrã, aos microfones das rádios ou nas páginas dos jornais, relegando para segundo plano outras realidades e angústias que mereceriam igual preocupação e indignação, mas que sem tamanha exploração e publicidade, são esquecidas e permanecem escondidas.
É certo e sabido, que tais “casos” – pela dimensão mediática que atingem -, acabam por ser alvo de um tratamento especial, puxando para si todos os recursos e atenção que o “caso” requer. Passam por cima daqueles que, sendo igualmente gravosos ou chocantes, não têm a duvidosa regalia de serem os eleitos dos OCS.
E nós, cidadãos desta Sociedade de “casos”, também nos deixamos, por vezes, alimentar por este sensacionalismo frenético, pois assim que conhecemos os primeiros contornos destes “casos” ficamos como que dependentes e desejosos dos relatos e pormenores que a imprensa vai desfiando, alheando-nos das adversidades com que nos deparamos no nosso quotidiano, ou que se encontram na nossa cidade, freguesia ou rua.
Uma sociedade é constituída por vários micro cosmos, por outras pequenas teias de relações e realidades. O meu ideal é o de uma sociedade constituída por várias comunidades, que olham mais para o seu interior do que para o seu todo, e que, dessa forma, conseguem descobrir os seus males (ou “casos”) antes de se depararem com o infortúnio colectivo.
Se cada um de nós olhar à sua volta, em vez de se centrar naquilo que o 4º Poder nos emana, em lugar de chorar colectivamente, poderemos indignar-mo-nos com as infelicidades que nos estão mais próximas e, ai sim, poder ser parte activa na resolução do problema, ou, no mínimo, da sua denúncia a quem de direito.
Mas o sofá das nossas casas continua a ser, além de mais cómodo, menos exposto às consequências que da denúncia ou participação activa nos possam advir. Por isso, alguns de nós continuam a sentir que o Dever é dos outros, mas que o Direito é nosso.
5 comentários:
Pedro, os órgãos de informação são responsáveis pela excessiva exibição deste caso, mas pelo contrário foi e é muito importante que dele tenhamos conhecimento e que nos actualizem a informação sempre que um facto determinante surgir.
Caro Luís,
o meu texto vai muito para além do teu comentário.
Este caso interessa sobretudo aos que nele intervêm, tanto no plano pessoal como no judicial e institucional.
Pergunto-te qual o teu interesse nesta situação particular?
Estou seguro que saberás que este não é um drama isolado e que muitos mais existem por este país fora.
Que nos desperta e entristece? Sim, é um facto.
Mas aquilo que eu digo, é que este é mais um "caso" que teve o privilégio de ser apanhado pelos OCS e, por isso, poder vir a ter um desfecho diferente dos demais, pela extrema publicidade e enfoque que nele depositaram.
E os outros, quem olha por eles?
O público foca-se nestes "casos" e esquece aqueles que estão mais próximos e nos quais pode ter uma intervenção real e útil. Mas alguns preferem olhar e sentir os dramas alheios via TV, em lugar de os procurar na sua rua, quiça na casa do lado.
Cumprs.
Caro Pedro,
Excelente post!
O voyeurismo é uma caracteristica das sociedades contemporâneas, basta ver o sucesso dos "reality shows"!
Infelizmente, quando os OCS pegam em alguns casos acabam por "dinamitar" a opinião pública, muitas vezes de forma falaciosa e tendenciosa. O dever de informar mistura-se com o julgamento pessoal que cada um dos jornalistas faz do acontecimento.
Este caso da "Alexandra" é mais um em que os OCS nem sequer se deram ao trabalham de ler a decisão judicial.
Saudações
Pedro,
preocupa-me principalmente a última parte do teu texto.
Ao contrário do que estamos habituados, em que o buraco da nossa rua, geralmente chateia-nos mais do que uma catástrofe do outro lado do mundo, nestes casos sim, somos muito solidários com o que está hermeticamente fechado na caixinha mágica.
Solidariedade plástica, uma vez que, tal como dizes, se houver uma situação mesmo à nossa porta em que possamos intervir, fechamos os olhos e fazemos de conta que não vimos.
Estranha forma de vida, como dizia a outra...
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