03 agosto 2009

Fato e Gravata

Quem quer parecer importante, não dispensa o fato e a gravata. É a indumentária de quem quer parecer ser, em lugar de ser. O fatinho, acompanhado pela respectiva gravata - há os que preferem o laço, tipo Nicolau Santos, Batista Bastos ou Rui Vieira Nery -, dá logo um ar de quem sabe do que fala. Um estatuto ganho à custa do que se veste e não do que se vale.
Um gajo engravatado e com jaqueta, pode por vezes dizer meia dúzia de asneiras, entre outras tantas mentiras, que muitos logo desvalorizam, considerando simples falhas na sua alocução e incoerências fruto do cansaço. Quem tem como traje esta indumentária, é cercado por uma certa áurea de eloquência e sabedoria, que, embora não tendo, parece ter.

É incrível como uma (ou duas) peça de roupa tem tamanha capacidade ilusória!

Um político competente, se ousar dispensar um bom casaco e o nó da gravata, corre o risco de ser desvalorizado, vilipendiado até, pois sem a protecção do “parecer ser”, somente o “ser” não lhe basta. E o exemplo do político, pode ser extrapolado para várias áreas e sectores profissionais.

É triste que assim seja. É a demonstração clara de uma sociedade que vive de aparências. De um país que primeiro vê a capa, e só depois o conteúdo. O marketing, que consegue vender a embalagem sem que antes se conheça a qualidade do seu interior. O cenário, que deslumbra a plateia, e desvia as atenções do mau actor.

Basta ver que, para impressionar e vender credibilidade, qualquer banqueiro impõe aos seus funcionários esta forma de vestir. A sua forma de vestir, qual Capone dos tempos modernos!
Um profissional liberal, não arrisca passear-se em público sem estar trajado a preceito, preferindo, portanto, esta forma de vestir, pois antes de se saber quem é, e o que vale, já se pressupõe que seja bom, de bem, e crível.

Pois é, a alegoria do fato e gravata pode ser transposta para muita da realidade, de muitos dos intervenientes da vida pública. Já diz o ditado: vícios privados, públicas virtudes.

Tinha razão o Zeca Afonso quando cantava: eles comem tudo e não deixam nada……eu acrescentaria, os gajos engravatados por prazer. Sim! Pois quem a isso é obrigado, é vítima, e não vilão neste filme.

Estou farto desta sociedade engravatada e daqueles que se julgam mais do que, na realidade, são. Começo a deixar de ter pena deles, e a iniciar um processo de desdém por esta gentinha.
Deve ser do calor, e da pouca roupa que se quer no verão.

Boas Férias.

N.B.- Congratulei-me com a pena de prisão - que espero seja mesmo efectiva -, ao engravatado Isaltino. Aguardo, agora, pela sentença do tão badalado “caso Casa Pia”.

13 comentários:

Rui Rebelo Gamboa disse...

E dar uma entrevista com uma estante cheia de livros atrás?? Até pode-se dizer as maiores asneiras...

Sobre o Isaltino, será da maior justiça realçar Marques Mendes. Um político como poucos há em Portugal, com a coluna vertebral bem recta.

Jordão disse...

Gostei, sim senhor! E boas férias!

Amigo Rui tens que admitir que ter uma coluna vertebral bem recta no caso do Marques Mendes é bem mais fácil, pois é pequenina!

Agora a sério, também gostei e muito da sua atitude!

Um abraço!

Carlos Faria disse...

Bem, nunca precisei da gravata para me sentir respeitado pelos faialenses (uso-a raramente em festas como casamentos) e cada vez sou mais solicitado para comentar assuntos nesta ilha. Mas claro reconheço que a gravata e a estante de livros (esta semana já comprei mais de uma dezena mas não espero nenhuma câmara para os mostrar) podem ser grande ajuda para um cidadão anónimo vingar nesta sociedade e esconder muita mediocridade. Apesar de tudo Louçã até dá um ar de seriedade e de moralidade sem nenhum desses acessórios.
Sobre Isaltino, este já deu a entender aquilo que eu mais temia: a justiça dos votos, como se vencer desse razão ao erro.

Unknown disse...

Pedro Lopes,

Em sentido inverso, falsos esfarrapados e bem falantes, esmolando moedinhas e pão, também os há, e muitos.

Se bem que concorde contigo na ideia central do post, discordo que todos sejam assim. Eu também "boto" gravata quando necessário. E tu também, i bet!

Saludos

Sérgio Santos disse...

Para complementar a gravata só mesmo o colarinho branco. Ambos são a receita ideal para se desconfiar do conteúdo.
Eu cá prefiro a malta dos laçarotes. Então se adicionarmos o laçarote, uns óculos de massa e a tal estante que o Rui fala, tá tudo dito!! Qual imagem de sua excelência da intelectualidade.

Quanto ao caso do Isaltino, devo dizer que me congratulo com a pena de 7 anos, pq sendo superior aos 5 que limitam a pena suspensa (se não me engano), lá terá de cumprir pena atrás das grades. Só foi pena o timming. Quase em véspera de eleições, parece-me que não ajuda à motivação dos eleitores para votar.

Abraço e deixa-me lá ir vestir a gravata que quem me paga o ordenado assim o exige. ;)

Anónimo disse...

Eu aguardo por novidades do caso Freeport ...

Toupeira Real disse...

Muito bem, senhor Pedro Lopes! Apesar de eu até respeitar a gravata e o laço porque cada um veste o que quer ou, como o senhor Sérgio, o que lhe deixam, não é o hábito que faz o monge. Se assim fosse o cavalheiro do apito dourado ou quase todos os que a polícia inglesa já apontou como estando envolvidos no caso FreePort (só falta um dos alegadamente implicados no caso e apontados pela polícia inglesa (sete, havendo 6 arguidos. Adivinham quem?)jamais seriam chamados à barra dos Tribunais. Coisas de colarinho lavado.
Aqui há tempos pretendia eu adquirir bilhete para o Alfa e dirigi-me à bilheteira. À minha frente um descamisado foi corrido pelo funcionário para a venda de bilhetes automáticos. O meu doutoral fato, com os respectivos apendices doutorais pasta e mala de viagem de marca teve direito a venda personalizada respeitosamente efectuada, acompanhada do aliciante upgrade universitário: " O senhor não pretende, antes, viajar em 1ª classe? ", não fosse tão ilustre fato viajar no meio de energúmenos pouco dados a um ar tão nobremente intelectual. Mas, como liberal que sou, viva o fato socretiano, o lacinho do Nicolauzinho e o casaco de cabedal do Judas!

Guarda-Freios disse...

Deve ser por isso que o César Júnior tem fatinho na fotografia do jornal onde escrevinha. E depois esqueceram-se de outro tipo de intelectuais à anos 60 com camisolinha de meia gola(preta, de preferência)a imitar Brel, pondo uma carinha lateral (parece que lhe chamam perfil)e um ar sisudo e inteligente. Cá na nossa terrinha o melhor exemplo é o representante do Bloco de Esquerda no PS.

Nestum disse...

Timothy Garton Ash, num livro seu, descrevia a farpela típica dos políticos deste lado do globo como o "traje nativo do homem ocidental".

Pedro Lopes disse...

Caros comentadores,

é com agrado que constato que todos perceberam a mensagem central.

Dos muitos aspectos positivos que têm os blogs, um deles é o facto daqueles que por aqui escrevem não necessitarem de foto de fato e gravata para fazerem passar as suas ideias e opiniões. O referido acessório fica para quem dele necessita para parecer ser o que não é, ou para quem é obrigado a usá-lo por terceiros.

Até porque o país (e o Mundo) está de tanga, e muito graças aos fatinhos dos banqueiros e afins.

Eu sou pelo cérebro e pela coluna vertebral, e não pelo adorno.

cumprimentos a todos.

Bota Sentido disse...

Tomei a liberdade de fazer referência a este seu post. Cumprimentos

Pedro Lopes disse...

Caro Bota Sentido,

disponha sempre. Por aqui não se paga direitos de autor.

Cumprimentos e bons posts.

O Regedor disse...

Boa Pedro