A elite micaelense do século XIX – principalmente da 2ª metade – destacou-se pela sua capacidade de antever o futuro e agir em conformidade. Exemplos: a introdução de novas culturas, de forma a minimizar os danos na economia local resultantes do declínio da laranja, como o tabaco, o álcool, a espadana, o chá, a chicória, a beterraba e o ananás.
Hoje em dia há certamente quem esteja à altura desses nossos antepassados. O problema é que, salvo raras, honrosas e facilmente indentificáveis excepções, essas pessoas não estão e não chegarão aos locais de decisão, porque, para tal, é necessário entrar no duro mundo político-partidário. Apesar de, à partida, essa posição poder ser compreensível, em última análise acaba apenas por ser uma opção fácil de alheamento que simplesmente não é desculpável.
10 comentários:
"Apesar de, à partida, essa posição poder ser compreensível, em última análise acaba apenas por ser uma opção fácil de alheamento que simplesmente não é desculpável."
É mentira.
Os partidos são pessoas. São pessoas que, por norma, não estão "
à altura desses nosso antepassados" e, por isso, e para salvaguardar o seu domínio (sabe-se lá do quê) inviabilizam por completo a participação dos bons.
Isso é um facto. O resto são desculpas.
Rui Raposo
caro Rui G,
acho que é mais o facto de as elites não necessitarem de estar nos partidos para obterem as benesses que as leva a não estarem nas concelhias e outras coisas pouco recomendáveis
Caríssimo, embora concorde contigo quando dizes que, agora, como no sec. XIX, temos gente dinâmica, atenta e competente, discordo com o paralelismo traçado.
Nessa altura (sec. XIX), ainda Portugal era um Reino, e as elites a que te referes, não eram mais do que os homens (por norma), que eram donos da terra e do dinheiro que por cá havia. É certo que existiam alguns homens de confiança do Rei, uns capitães donatários e uns regedores, mas quem detinha a terra, detinha o poder. Essas iniciativas a que aludes, não eram mais do que a defesa dos seus bens e das suas posições sociais. Pouco tinham de nobre, e o bem comum era secundário face á preservação do status quo.
Nos dias que correm, o bem público merece (deve merecer) a primazia nas medidas propostas e defendidas pelos paridos.
Também concordo quando defendes que muita gente competente e capaz não se aproxima dos partidos, logo não tem grande participação na definição das políticas a implementar. Mas neste caso, eu – à semelhança do Rui Raposo –, não culpo os próprios. Culpo antes os partidos por não serem capazes de motivar e mobilizar essas pessoas, de modo a que possam, de forma desprendida e a prazo, dar o seu contributo à coisa pública. Um partido deve ser um espaço de discussão de ideias, aberto à sociedade e em constante renovação. Mas, por vezes, são os de “dentro” que os estragam e os tornam amorfos, espaços de luta pelo poder e em nome de protagonismos pessoais, em lugar de espaços de reflexão e debate.
Há jovens que olham para os partidos e para a política, como uma oportunidade de carreira profissional, mais do que um serviço, uma função que se presta a causas públicas.
As politicas são pensadas e aprovadas pelos políticos, mas são postas em prática, executadas, pelos profissionais das mais diversas áreas, e visam os membros dessa sociedade – à qual, e da qual, tb fazem parte aqueles que se dedicam á politica.
Viver em sociedade, sem a sombra de esfera politico-partidária, parece-me essencial, para que se possa sentir, antes de agir.
Caro Pedro Lopes,
É verdadeiramente injusto desvalorizar o papel das elites do século XIX, dessa forma. A verdade é que a larga maioria das populações vivia directamente dependente deles, aliás a disposição das casas por essas freguesias fora o comprova facilmente. E no caso da laranja acabar e não existir mais nada, de certeza sobreviveriam, os outros certamente que não. Por isso, essas iniciativas, tendo por objectivo (e muito bem) manterem a sua riqueza, tinham também muito de pensar no "bem comum".
No entanto, é ainda mais injusto desvalorizar os visionários que foram. No chá, trouxeram cá chineses para ver se as plantas se adaptavam, as primeiras actividades para difundir a imagem dos Açores no estrangeiro (turismo), a primeira revista agrícola nacional, etc. Verdadeiros empreendedores e hoje que tanto se fala em empreendedorismo, esses devem ser exemplos a seguir. Aconselhava, sobre esses assuntos, os diversos trabalhos que estão disponíveis na biblioteca de Universidade dos Açores, que mostram como tivemos uma geração riquissíma no séc XIX.
Em relação ao paralelismo com os nossos dias: no século XIX muitos foram os que tendo a possibilidade de estarem nessa linha de frente, não o fizeram, preferindo o comodismo que a sua família lhes permitia. Hoje, claro que as condições são diferentes, mas apenas porque todos podem se chegar à frente, não dependem do berço. Culpar os partidos, em oposição às pessoas em geral, é partir de um princípio de desresponsabilização, que eu não partilho de todo. Penso que quem acha que tem a capacidade de acrescentar algo, não deve ficar à espera que os partidos o chamem, antes deve tomar ele próprio a iniciativa.
Como disse no post, à partida até posso compreender esse distanciamento, exactamente pelas razões que apresentaram, mas em última análise penso que é apenas alheamento comodista. Porque se é verdade que podem não querer se envolver nesse tal ambiente amorfo de que falas, também é verdade que os partidos são a base do processo de decisão, portanto o não participar (quando se tem a capacidade de acrescentar algo de melhor) é para mim indesculpável. E eu estou a falar de quem decide, não de quem se limita a executar. São duas coisas completamente diferentes, sendo ambas essenciais, o primeiro tem que ter qualidades mais abrangentes que o segundo, e são essas qualidades que faço referência das elites do sec XIX.
Carissímo,
dizes tu que muito do nosso povo vivia dependente dessas elites; pois bem, para mim ser dependente de alguém ou algo, é, só por si, negativo. Essa dependência era fruto da concentração de terras, e o povo pagava essa dependência do Senhor com o seu trabalho.
Rui, como essas "elites" eram os detentores das terras, eram eles os únicos a lucra com as culturas que nelas se produzia. Logo, quando uma cultura deixava de ser rentável, isso significava uma perda de lucros para o dono da terra, mas poderia ser um descanço para quem nela trabalhava árduamente. (pois só trabalhava e nada lucrava)
Quanto ao teu segundo parágrafo, respondo transcrevendo a parte inicial do meu primeiro comentário;
"concordo contigo quando dizes que, agora, como no sec. XIX, temos gente dinâmica, atenta e competente,(...)"
Rui, no que toca ao "pararelismo como os nossos dias" que apresentas no post, quando digo que não concordo, digo-o exactamente pelo facto de, antes ser necessário ser-se dono de terras e ter dinheiro (posição social), enquanto hoje - e ainda bem que assim é -, quem quiser participar e ter voz activa, poder fazê-lo livremente, sem necessidade de carregar consigo um sobrenome que lhe dê a dita voz.
Apenas acrescento que muito boa gente não se filia em nenhum partido, pois parece ter de romper relações com pessoas de outra cor politica, havendo inclusivamente "facções" dentro dos própriso partidos, o que pode tornar a politica pouco atraente para quem procura, tão-só e apenas, dar o seu contributo para a melhoria da nossa sociedade.
É a isso que me refiro quando, de certo modo, culpo o estado de alguns partidos e de alguns politicos, que contribuem para um afastamento da tão propalada Sociedade Civil.
E, Rui, porque não chamar os melhores?
Porque razão devem ser só os que se perfilam, os eleitos para cargos de governação ou de nomeação?
Então e o mérito, onde o colocas?
É que escolher, somente, de entre os que estão filiados no partido do governo, limita, em muito, a escolha de gente capaz e preparada para as funções de maior responsabilidade e que afectam o rumo da nossa sociedade.!
Caro amigo, achas que as melhores "cabecinhas" se vão colocar de dedo no ar e em bicos de pés, como que dizendo; "estou aqui, e disponível. Vejam lá se não se esquecem de mim!"
Rui, se uns optam pela abstenção (o que eu recrimino vevemente), há que olhar com atenção para o sinal dado por 1695 concidadãos (1,88% do total de votos), que votaram em Branco nas últimas eleições Regionais. São um número mais do que suficiente para eleger um deputado. [então se fosse pelo circulo do orvo, daria para encher a ALR :)]
Estes não viraram costas. Estes não foram "comodistas". Quiseram enviar um sinal. Qual?
Rui, eu considero - à tua semelhança -, que os partidos são essênciais num regime democrático, e que são a forma mais lógica de expressão e organização das diferentes ideologias politicas.
Mas gostaria de ver, um dia, um líder partidário com coragem em cortar com o passado, sem fazer "trocas e baldrocas" e "favores + lugares", para os que já lá estão (a "prata da casa") e para os que o empurraram até ao poder. Sim, porque quem empurra, quer ver recompensado o seu esforço......mesmo que o "empurrador" não perceba nada de nada, lá se há-de arranjar qq coisita. (Olha o Santana Lopes, já se está a perfilar para um lugarito.....)
E, claro, em todo o tempo e em todos os lugares, há gente mais e menos competente, mais e menos séria. E assim vamos caminhando; uns bocadinhos a pé, outros andando.
Companheiros,
muito já foi aqui e dito, e bem dito. Gostaria apenas de acrescentar que no sábado passado senti que a democracia tem futuro, concretamente aqui na região.
Como sabem, no sábado comemorou-se a Semana Europeia da Juventude. As comemorações decorreram na UAC com inicio às 9h00 da manhã e imaginem, o auditório contava com cerca de uma centena de jovens com vontade de dar o seu contributo para definir as linhas gerais do que se vai fazer na UE no próximos 10 anos, isto a um sábado de manhã, às 9 horas da matina.
Facto que foi realçado, e amplamente realçado pelos ilustres presentes.
Para além da experiência enriquecedora de trocar ideias sobre a europa, sem ser dentro de uma sala de aula, trouxe comigo o peito cheio de esperança, pois acredito que os jovens de hoje, serão melhores politicos amanhã!
Acredito que o futuro da Democracia passará por uma participação mais activa dos cidadãos, dando-lhes a possibilidade de participar nas decisões politicas e não apenas através do voto.
Parece-me que essa é parte do problema da abstenção. Os cidadãos querem ser ouvidos nas decisões que o governo toma e não apenas em escolher meia dúzia de politicos profissionais de 4 em 4 anos.
Sinto que a nossa geração quer fazer, quer participar e não apenas ser liderada por alguém que muitas vezes, tem menos competência que qualquer um de nós, mas que foi levado ao colo até ao poder por formas menos ortodoxas.
Sinceramente, senti no sábado que afinal não somos a geração rasca e preguiçosa, mas que apenas estamos desiludidos com o rumo que tomou a liberdade conquistada e que quando for preciso, marcaremos presença. Mesmo que seja a um sábado às 9h00 :)
Grande abraço
nem de propósito... alguém viu a entrevista de josé miguel júdice, ontem na sic noticias? também ele falou sobre o que estamos a falar. há muito tempo que não gostava tanto de ouvir uma entrevista.
entre muitas outras coisas, falou da questão dos "carreiristas" nos partidos. eu também não posso com eles.
uma vida inteira de dedicação a um partido não tem obrigatóriamente de significar uma vida inteira de cargos políticos.
Rui Raposo
Concordo em parte com o Rui Gamboa e com o Pedro Lopes. A minha concordância resume-se assim:
a elite micaelense do séc. XIX foi realmente visionária, sem dúvida, mas à custa da escravatura daqueles que trabalhavam apenas para ter o que comer.
Cumprimentos
Regedor,
O que realço, e mantenho, é que poderiam (e muito o fizeram) limitar-se a viver e resolver os problemas quando chegassem, mas essa pequena elite distinguiu-se pela capacidade de antever o futuro. E é por isso que é elite, mais nada.
Rui Raposo,
Se alguns carreiristas políticos nos partidos, eles estão lá porque outros deixam esses lugares abertos.
Pois, a verdade é que os partidos não são propriamente terra de mentes intelectalmente brilhantes. É lugar sim, de bons estrategas, de raposas velhas, que se mexem bem atrás do pano.
São imensos os casos de ministros, exemplares intelectos que na politica são absorvidos pelas raposas velhas.
Talvez por isso, não se cheguem à frente nas lides partidárias, contribuindo de outras formas para a sociedade.
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