20 junho 2009

Que liberdade, André Bradford?

A saga do voto obrigatório, em vez de ser devidamente remetida para a gaveta do esquecimento, pelo menos enquanto for vista pelo prisma da conveniência (a culpa é desses não inteligentes que, desta vez, não me deram jeito nenhum), continua a ser trazida à luz do dia, porventura até se tornar um caso corriqueiro, perante o qual o cidadão-eleitor se mostre (con)vencido, por exaustão.

Desta vez foi André Bradford a repetir César, ainda que num prisma mais cauteloso e mostrando abertura para outro tipo de discussão, certamente conducente a perspectivas mais próximas da realidade e mais fundamentadas. Não vou repetir o que já disse aqui e aqui, dando-o como reproduzido, mas reafirmo a minha total oposição ao dito voto obrigatório, em nome da liberdade.

Correndo o risco de irritar alguém, apenas quero lembrar que o que está em causa na imposição do voto obrigatório é o conceito de liberdade em si mesmo.

Sendo breve, temos que:

De um lado, a liberdade é vista como sendo algo inato ao próprio Homem, é um direito natural, com o qual já se nasce, dispensando-se, por isso mesmo, quaisquer intermediários na definição do seu uso. Dito doutro modo, na esteira de Isaiah Berlin, a liberdade consistirá na ausência de qualquer tipo de coerção ilegítima por parte de terceiros; trata-se do exercício pacífico de uma determinada opção sem a interferência de outrem. Vista assim, a liberdade apenas respeita à pessoa e à sua consciência, dispensando qualquer Rousseau que venha "obrigar os homens a serem livres".

Do outro lado da barricada, temos aqueles que não concebem a liberdade como um direito absoluto, antes vendo-a como uma mera concessão do Estado ao individuo. Nesta perspectiva, não existe liberdade, enquanto tal, existem liberdades concretas. Sob a tutela e fiscalização do Estado, essas liberdades são concedidas ao individuo na exacta medida das suas necessidades e, sobretudo, das necessidades desse mesmo Estado, que se julga legitimado pela "volonté générale", pelo que cada homem é visto como membro de um todo indivisível para o qual transfere todos os poderes sobre a sua pessoa.

Enquadradas as coisas, será caso para dizer, aproveitando a frase de Bradford, que " não (se) considera normal nem saudável que, 35 anos depois da implementação do voto livre", venha alguém querer racioná-lo, em nome das ditas liberdades. No século XX, essa atitude conduziu ao totalitarismo comunista, com as consequências conhecidas.

Não quero crer, por isso mesmo, que alguém, ainda que inconscientemente, queira de volta o Gulag.

4 comentários:

Tiago R. disse...

Bradford faz o que pode para tentar resolver a confusão lançada por Carlos César, numa declaração precipitada por sondagens negativas e reafirmada na irritação dos piores resultados de sempre do PS.

No plano teórico, o Estado só pode pôr limitações à liberdade dos cidadãos na medida em que haja outras liberdades ou valores a proteger.

No plano prático, imagino que uma alteração deste género só poderia ser feita depois de uma revisão constitucional, portanto maioria de 2/3 e apenas lá para o fim de 2010. Portanto, as declarações sobre o voto obrigatório são mera poeira informativa.

Obrigatório? Nem pensar!

Anónimo disse...

quem brinca com o fogo queima-se, quem anda na tv a dizer bacoradas a defender o chefe queima-se.

em nome da rosa disse...

Para um Comunista como o Tiago R., o regresso aos Gulag seria uma alegria. Mas estranhamente está a favor da democracia e contra a obrigatoriedade de seja o que for. Estranho!

O Dr. "Bradofardo" para ter eco tem de carregar um fardo pesado que é ser acólito do César.
Uma missão como qualquer outra.

Anita e Miguel disse...

Engraçado que apenas o PSD se refere a um mais alargado acesso ao acto de votar nos Açores. Possivelmente mais longe das urnas, mas também mais longe de carrinhas oficiais e de IPSS´s à disponibilidade...;)